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Djonga e muito papo reto no seu álbum de estreia, “Heresia”

Sempre tive um fetiche por primeiros álbuns. Dentro do rap, então, acredito que meus álbuns preferidos são os primeiros dos MC’s que admiro. É um meio tão competitivo, onde a autoafirmação se faz tão necessária, que é muito fácil errar a mão e passar dos limites ou ficar muito aquém do que o público espera. É uma questão de postura, de como você pretende dar as cartas no “rap game”. É, também, como você administra o nervosismo, a inexperiência e expõe o que você pensa de forma ampla pela primeira vez. Você vive naquele paradoxo entre ser maduro o suficiente para compilar ideias e lança-las ao público e ser tratado como novidade, como alguém que ainda tem muito para aprender.

Nessa linha tênue entre passar a vivência e ser tratado como novidade, andou Djonga. Em conversas com amigos próximos, eu sempre falava que, apesar dos excelentes trabalhos, eu gostaria de ver um trabalho em que o Djonga conseguisse dizer mais coisas. Não que ele não mande bem, longe disso. Ele rouba a cena nas participações que faz e tem sua caminhada de anos dentro da cultura hip hop. A parada aqui é como se fosse um livro, entendem? É uma questão de aprofundamento das ideias, de explorar limites, de destravar toda sua vivência.

Sabe o que acontece, galera? Escrever é um ato de violência. Não é só chegar aqui e fazer textão, não é só ter uma ideia foda e escrever um livro e, da mesma forma, não é só compor pensando num álbum que retrate teu pensamento e estado de espírito naquele atual momento. Muitas das vezes você passa por momentos desagradáveis, você revira compartimentos da sua memória que preferiria deixar de canto, fechados, e você é obrigado a lidar com tudo isso, se seu objetivo é realmente entregar para o público todo o papo reto que você tem para passar. É isso que eu gostaria de ver nesse trabalho mais extenso: como Djonga lidaria com as graças e os danos de produzir um recorte tão profundo do seu próprio pensamento.

Minhas dúvidas foram tiradas, principalmente, quando Djonga decide tirar uma faixa de um disco curto (apenas 10 faixas) para colocar um interlúdio com uma explanação do FBC sobre vivência e a violência que age sobre a criação, sobre como existe um processo de evolução e luta para se tornar maduro o bastante e conseguir dizer o que se deseja, sem subterfúgios ou adiamentos. Ouçam esse interlúdio atentamente. É uma aula em dois minutos.

Musicalmente, dentro do meu conhecimento parco, o disco ficou a cara do Djonga. Instrumentais densos, propícios para a quantidade de papo reto que ele tinha para soltar, chamando a atenção para dentro do universo proposto por ele. É uma das coisas que ele melhor sabe fazer, aliás, virar a atenção para o que ele tem para dizer. Isso está acima das técnicas de rap e essas coisas todas. E, dentro desse discurso, há o estilo Djonga de dizer as coisas. Nada menos do que socos na cara a cada linha. Djonga é extremamente autêntico e verdadeiro e explorou seus limites nesse seu primeiro álbum, o que resultou num trabalho lindo. A primeira e última (essa com refrão do BK’) faixas foram momentos de pura genialidade. Mas não pulem faixas, cada uma tem sua dose de papo reto. Apenas se deem ao trabalho de ouvir.

Eu enxerguei milhares de referências, não só as utilizadas por ele, mas minhas também, dentro de vários aspectos do álbum. Mas de que adiantaria fazer um review assim com um álbum que acabou de sair? Acho que a única mensagem que eu posso passar dentro do que me compete, que é lírica e literatura, é que a lírica existe num âmbito muito pessoal. Se vocês não ouvirem com atenção, deixando um pouco de lado as linhas irreverentes e procurando, realmente, um sentido próprio das palavras do cara, vocês nunca entenderão o quão violento e difícil é esse processo. Consequentemente, nunca conseguirão respeitar o trabalho que é chegar até esse ponto de lançar um álbum.

Reparem no papo reto. Sejam papo reto. Vivam papo reto. Djonga fez uma pérola.

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